
Mamãe dizia outro dia: você bebê se agarrava no meu pescoço e tinha quase um troço, queria a mãe, não "o maternal", achava a escola uma violência descomunal. La-crime-java aflição, perder meu colo, que crime e condenação!
Mamãe, até hoje te reencontro no Saber, não na Escola. E até hoje choro quando me tiram de teu pescoço de palavras, de teu colo de poemas, de teu seio de sentidos, pra me pôr no meio dos chatos e babacas, tendo de mandar ou obedecer os prosaicos, ameaçado de me tornar mero aluno ou pior, "aluno aposentado" , jogador que pendurou a chuteira e tá no banco como professor da bolerada, ou seja, véinho professor blablacento, cagando regra em disenterias sintáticas axiomáticas axiológicas escolásticas, contando o mundo como se não passasse de filmes já assistidos desde sempre e para sempre, assimilando o óbvio, ou melhor, o que já se "sabia" antes de ver, monoglota tradutor das polifonias da existência, lendo certezas com bundão sentado, pipoca de veneno e boca aberta cheia de dentes, e depois estragando a surpresa das pessoas que ainda não assistiram, e talvez nem fossem apenas assistir, mas sim viver, isto é, confrontar o novo, o inédito e o próprio. Sei que isso, viver, é incompreensível pra essa gente, os explica-dores profissionais e suas cartilhas. Queria ser criança de novo, chorando no pescoço de mamãe, sem precisar entrar na Escola e ter de escutar esses prosaicos, escutá-los mais até do que eles mesmos se escutam, maldito dom que Alguém me deu de ser médium dos recalques dos fracos e ressequidos.
-Unzuhause-
"Meu professor de análise sintática era o tipo do sujeito inexistente. Um pleonasmo, o principal predicado da sua vida regular como um paradigma da 1ª conjugação. Entre uma oração subordinada e um adjunto adverbial, ele não tinha dúvidas: sempre achava um jeito assindético de nos torturar com um aposto. Casou com uma regência. Foi feliz. Era possessivo como um pronome. E ela era bitransitiva. Tentou ir para os EUA. Não deu. Acharam um artigo indefinido em sua bagagem. A interjeição do bigode declinava partículas expletivas, conectivos e agentes da passiva, o tempo todo. Um dia, matei-o com um objeto direto na cabeça".
Paulo Leminski